Neste
segundo artigo, exponho a segunda razão que me distanciou definitivamente do
arminianismo. O fato é que Deus, em todas as épocas, "precisou" de
homens que nutriam uma correta perspectiva dele, de si mesmos e de seus
semelhantes. Aliás, este é o alvo supremo da vida cristã e a meta da verdadeira
espiritualidade. Homens que viam a Deus por uma correta perspectiva teológica,
enxergando-o pela ótica da Escritura: um Deus infinito, soberano, onipotente,
onisciente, onipresente, que rege o seu mundo criado com sabedoria infinita e
que dispõe de meios eficazes de antemão planejados para levar a história ao fim
que ele mesmo planejou, agindo sempre segundo o conselho de sua santa vontade.
Homens
que se vejam como o grande apóstolo Paulo - e nesta santa fileira podemos
colocar Lutero, Calvino, Jonathan Edwards, Matthew Poole, John Owen, John Gill,
C. H. Spurgeon, D. M. Lloyd-Jones, Gerstner, R. C. Sproul, etc., e quem sabe eu
e você, a história dirá -, que se considerava o mínimo entre os santos, o principal
dos pecadores, exemplo daqueles que haveriam de crer em Deus, um verdadeiro
referencial para os eleitos de Deus contemporâneos seus e seus sucessores. Que
também via os homens por uma correta perspectiva espiritual, pela ótica da
doutrina acerca do homem revelada na Escritura.
Para o
apóstolo Paulo, os homens eram salvos ou não. Os salvos eram os eleitos de
Deus, predestinados para filhos de adoção por Jesus Cristo, chamados
eficazmente pelo evangelho, ressuscitados de suas sepulturas espirituais pela
ação miraculosa do Deus triúno para tomarem assento nos lugares celestiais em
Cristo, marcados para entrar na história humana como ovelhas do Pai e do Filho,
resgatados pelo sacrifício expiatório, propiciatório e substitutivo do Filho na
cruz do Calvário e regenerados pelo Espírito Santo em sua vocação eficaz e
irresistível, e selados pelo mesmo Espírito para o dia da redenção. Sua
mensagem era: Deus salva pecadores!
Os outros
homens, segundo seu evangelho, eram eleitos ou reprovados, o que o motivava a
pregar intensamente o evangelho a fim de ser o instrumento de Deus para a
descoberta dos eleitos, que Deus soberanamente ia colocando em seu caminho,
dentre os quais podemos citar a vendedora de púrpura Lídia e o carcereiro de
Filipos.
Paulo era
grato a Deus por ser colaborador de Deus e cooperador de Deus em favor da
Senhora Eleita, a Igreja. Era humilde, como não poderia deixar de ser, por ter
sido escolhido por Deus para fazer um grande serviço no seu reino, que ele
sempre esteve consciente de que não era merecedor. Alegre ele dizia: "Mas
Deus me escolheu desde o ventre" e em outro lugar, "Ele nos
elegeu antes da fundação do mundo".
Diferentemente
desta visão salutar da Escritura, ilustrada com um máximo exemplo, o do
apóstolo Paulo, está a visão de mundo arminiana.
Até pouco
tempo, o arminianismo, desde a sua concepção em contraposição ao calvinismo,
conviveu com suas inconsistências lógicas internas, quando foi definitivamente
levado aos seus extremos lógicos [2], através de seus proponentes mais aferrados
no cenário evangélico canadense e americano, liderados por Clark Pinnock [3] -
e já há representantes tupiniquins [4] do arminianismo levado aos seus extremos
nesta terra brasili!-, e chegou a ponto de ver Deus com a imagem inversa
daquela que é descrita na Escritura, esvaziando todos os seus atributos e
criando um "Deus" finito e impotente (ou deus? ou um ídolo?), que nem
ao menos sabe o que poderá acontecer no futuro, tendo em vista que há um ser no
universo chamado homem, livre, dotado de um "livre-arbítrio",
imprevisível, com ações não causadas e que é uma ameaça ao cumprimento de Suas
predições na Escritura, por não permitir que Deus preveja nenhuma de suas ações
futuras. Na visão arminiana extremada, que é totalmente humanista e antibíblica,
assumindo uma postura quase liberal (no sentido acadêmico e histórico do
termo), Deus é rebaixado quase à posição do próprio homem caído, ou talvez um
pouco abaixo, e o homem sobe a uma estatura quase do Deus da Bíblia. Esta
visão, obviamente, não passa de produto da imaginação do homem caído em seu
projeto de autonomismo apóstata, inspirado, como não poderia deixar de ser,
pelo arqui-inimigo de Deus, que foi o primeiro a desejar essa autonomia
rebelde. O autonomismo apóstata só poderia levar à desconstrução [5] da
teologia, como já era previsto. De fato, o arminianismo, que enfatiza
exageradamente o autonomismo, é a prova mais completa da depravação total do
ser humano!
Quando o
arminianismo extremado é assumido como visão de mundo e fornece os pressupostos
para a análise da Escritura, o homem passa a ocupar o centro das atenções e
Deus sai para segundo ou terceiro plano. Os superpoderes que os homens passam a
ter são a evidência disso, pois até mesmo os homens não-regenerados que a
Bíblia ensina estar mortos em delitos e pecados passam a não mais ser vistos
assim, mas são vistos como capazes de ascender aos céus, se quiserem, e até
mesmo sair de lá, caso entrem. Isso tudo nada mais é do que aquela antiga
heresia que ficou sendo conhecida na história da igreja como pelagianismo [6]
ou o seu alomorfe (outra forma), o semi-pelagianismo. De acordo com a visão
arminiana, nem Deus pode deter um homem assim tão poderoso, mas tem de ficar
sempre de plantão para poder contornar os problemas que o homem cria no universo,
que podem até frustrar os seus planos, e forçosamente Ele tem de ficar
costurando a história até ver se ele consegue fazer aquilo que antigamente
predisse na Escritura, e talvez "impensadamente", por "não
saber" do que o homem era capaz. Na visão da Escritura, todos os problemas
que os homens causaram e irão causar, sob insinuação do arqui-inimigo de Deus,
são conhecidos exaustivamente por Deus e jamais o pegaram ou o pegarão de
surpresa, pois Ele é onisciente e sabe para onde a história está indo e jamais
perdeu ou perderá o controle de tudo o que acontece no mundo criado, como
supõem os arminianos extremados. Mais ainda, a doutrina bíblica da providência
divina ensina-nos que tudo está decretado pelo Deus Todo-Poderoso, de modo que
não existe algo que ocorra sem ser produto de seu decreto eterno.
Por outro
lado, no arraial evangélico, essa visão arminiana constrói os super-pastores,
os verdadeiros todo-poderosos que ameaçam tomar o lugar de Deus, que
determinam, decretam, chamam à realidade as coisas que não são, abençoam,
profetizam prosperidade e etc. Em suma, fazem coisas que antigamente só o Deus
da Bíblia podia fazer. Quem sofre mais nisso tudo são as ovelhas fiéis e
sinceras que são manipuladas por líderes com esse tipo de orientação arminiana
extremada, que oferecem para elas ao invés de eleição e segurança eterna e
absoluta, uma posição de candidatas ao reino dos céus, ameaçando-as por
qualquer motivo, até os mais frívolos e banais, de perderem sua salvação. O
arminianismo é um terrorismo espiritual pior do que o encabeçado por Osama bin
Laden! É com tristeza profunda que eu constato e registro esta realidade.
Ao ler a
biografia de Armínio e suas obras completas, desconfio de sua insanidade.
Desconfio também da insanidade do sistema "teológico" que seus
discípulos criaram, uma monstruosidade humanista resultante do autonomismo
apóstata, que solapa a salutar visão da Escritura que, realmente, desde que
humildemente abraçada, pode produzir instrumentos realmente poderosos nas mãos
de Deus. A proposta teológica arminiana prefigurava embrionariamente a
desconstrução da genuína teologia bíblica e, forçosamente, não poderia fazer
outra coisa. Muito embora seus defensores hoje digam que não apoiam o
desconstrucionismo, na prática, porém, eles estão desconstruindo toda a sã
doutrina. Deus já se encontra desconstruído em seus atributos e, ao que tudo
indica, a própria Trindade não poderá escapar das propostas insanas dos
arminianos extremados.
Em
contrapartida, para você recuperar o fôlego, a teologia bíblica genuína já
invadiu as vidas de muitos pecadores na história e produziu santos na Igreja do
Deus vivo, a ponto de um desses santos, Jonathan Edwards, poder soar o alerta
em sua congregação, mostrando vividamente os perigos que correm os "Pecadores
nas mãos de um Deus irado". (Com ar de zombaria, de repente, os
liberais diriam que isso foi um dos "desatinos" do período
pré-iluminista!). Ao que me parece, e também creio que a R. C. Sproul, a
teologia arminiana e seu parceiro muito chegado, o liberalismo, refletem nada
mais nada menos do que a cena de um "Deus (ou deus) nas mãos de
pecadores irados!".
Que Deus
nos guarde das idéias perniciosas desses pecadores irados, que estão imergindo
muitos cristãos sinceros num verdadeiro buraco negro e a fé cristã num lago de
areia movediça. Coisas estranhas estão surgindo por aí afora, como o teísmo
libertário, a teologia do processo, a teologia da abertura de Deus (que implica
num lógico e total esvaziamento da onisciência de Deus, a partir do qual Deus
passa a não conhecer o futuro), a emergência veloz de um neo-gnosticismo gospel
e a última novidade - digo última por que eu não sou onisciente como os
arminianos extremados, graças a Deus, e não sei o que eles estão aprontando ao
redor deste mundo - é que eles já estão trabalhando para esvaziar o inferno
[7]. Era só o que faltava. Será que eles, no fundo, não estão é com medo de ir
para lá? Claro, pelo sistema arminiano extremado, ninguém pode ter certeza
absoluta de salvação e de que não vai parar lá. Então, dizem eles agora, vamos
construir um túnel "teológico" para resgatar aquelas pobres almas que
supõem os adversários que estejam lá (bem baixinho: os calvinistas!) e
comecemos a empreitada de diminuir sua temperatura, pois pode ser que paremos
lá, ninguém sabe o futuro, nem Deus nem nós! Para os liberais a tarefa foi
fácil, bastando desconstruir o inferno e pronto: problema resolvido!
O
arminianismo extremado, querido leitor, é, na realidade, a "teologia"
da incerteza, da insegurança e da desesperança: um buraco negro de areia
movediça. Fortalece o homem e enfraquece ou quase extingue Deus. É antibíblico
desde os seus fundamentos e inconsistente com a Escritura. Saiamos de sua
região inóspita correndo, aborrecendo até a roupa manchada de suas nódoas
miasmáticas e sigamos em direção aos pastos verdejantes da sã doutrina da
Escritura, onde ouvimos a voz doce e suave do Bom Pastor, encontramos garantia
de vida eterna, como também paz e segurança absolutas por estarmos seguros nas
mãos Daquele de quem ninguém pode arrebatar suas ovelhas, porque Ele é maior do
que todos e do que tudo. Nas mãos desse Deus verdadeiro, não nas de uma deidade
desconstruída por pecadores irados, você pode ser realmente uma bênção!
Reafirmando
os ideais da Reforma:
Sola Scriptura
Sola
Gratia
Sola Fide
Solus
Christue
Soli Deo
Gloria
_____________________
Notas:
[1] O Colégio dos Pastores na Obra da Restauração de Tudo tem sua sede na Rua Guaiuba, 231, Acari, Rio de Janeiro. Todas as últimas semanas de cada mês, os evangelistas e pastores se reúnem para Estudos Bíblicos e Teológicos Avançados e aulas de línguas, com o objetivo de manter os líderes na Obra da Restauração de Tudo bem informados sobre as principais tendências teológicas no evangelicalismo contemporâneo e para reciclagem e atualização nas disciplinas de Hermenêutica, Exegese do AT e do NT, Teologia Bíblica, Teologia Sistemática, Teologia Contemporânea, Línguas Originais da Bíblia, Lingüística, Inglês e Língua Portuguesa.
[2]
Observe que nem todos os arminianos levam o arminianismo aos seus
desdobramentos extremos, ficando com a forma mais branda não extremada do
mesmo, não trabalhando suas inconsistências internas. Quando o arminianismo
começou a resolver suas inconsistências lógicas internas, ele revestiu a forma
extremada defendida por Clark Pinnock e seus confrades arminianos, no livro
Grace of God and the Will of Man, que apresenta a verdadeira face do
arminianismo.
[3] Caso
o leitor queira inteirar-se mais profundamente desses assuntos que abordarei de
passagem neste artigo, leia os seguintes livros de Clark Pinnock (autor ou
organizador), Grace of God and the Will of Man, The Opennes of God, A Wideness
in God's Mercy, Most Moved Mover. Antes, eu o aconselho a vacinar-se com as
seguintes respostas dadas a esses escritos arminianos extremados: R. K. Mc
Gregor Wright, A Soberania Banida: Redenção para a cultura pós-moderna (Editora
Cultura Cristã); Paulo Anglada, Calvinismo: As Antigas Doutrinas da Graça
(Editora Puritanos); Os Cânones de Dort (Editora Cultura Cristã); Thomas R.
Schreiner e Bruce A. Ware, Still Sovereign: Contemporary Perspectives on
Election, Foreknowledge, and Grace; Bruce A. Ware, God's Lesser Glory: The
Diminished God of Open Theism. Todas essas obras podem ser adquiridas no site
www.amazon.com.
[4] Ouça
os 2 CD's de Ricardo Gondim sobre Predestinação e o leitor, após ter lido as
obras de Clarck Pinnock citadas na nota anterior, verá que Gondim defende os
pontos de vista do "open theism" (teísmo aberto, ou teísmo
libertário, ou teologia da abertura de Deus), ainda que de um modo velado e
disfarçado, pois não cita as fontes sobre as quais se apóia pesadamente.
Contudo, é fácil perceber que os pressupostos nada ortodoxos de Gondim nesses
CD's derivam dos teístas libertários, com os quais ele, como arminiano, se
simpatiza, além de ser um passo à frente nos rasgos de liberalismo que
demonstrou em É Proibido, o que a Bíblia permite e a Igreja proíbe. Mas o
leitor deve seguir o seguinte conselho: ouça os CD's de Gondim assentado e bem
apoiado, pois neles Gondim consegue a façanha de reverter a história,
qualificando como ortodoxos Pelágio, Armínio e os arminianos em geral, até os
do teísmo libertário, dos quais ele é um dos representantes no Brasil, e
condenando e qualificando como hereges Agostinho, Calvino e todos os reformados
que defendem, como diz ele, o predestinismo. Está pasmado? Vá conferir e depois
me responda: Será Gondim o alter-ego ("outro eu") de Pinnock ou de
Richard Rice no Brasil? O tempo nos dirá. Penso que quem tem visto com tão bons
olhos a teologia de Charles Finney, como é o caso de Gondim, só pode usar o
Soli Deo Gloria dos reformadores no final de seus artigos como um disfarce.
Cuidado, leitor!
[5]
Segundo Ricardo Quadros Gouvêa em Fides Reformata 2/1, p. 64: "O
desconstrucionismo é uma prática de leitura baseada em uma hermenêutica de
suspeita em que o texto é entendido a partir da sua auto-desintegração teórica.
A desconstrução implica na subversão, na descentralização de qualquer origem
perceptível de discursos autoritativos associados a 'metanarrativas', isto é,
macroestruturas teóricas como, por exemplo, sistemas filosóficos e
teológicos".
[6]
Pelagianismo - a essência do ensino de Pelágio era sua idéia errônea de que o
arbítrio, mesmo no estado caído dos homens, era essencialmente livre da
corrupção do pecado e possuía a capacidade em si mesmo de escolher e realizar
boas obras, conforme R. K. Mc Gregor Wright, A Soberania Banida, p.23. Também,
segundo define este mesmo autor à p. 256, "o semipelagianismo foi uma
teologia de acomodação surgida no séc. 5, que ensinava que a graça de Deus não
era necessária para o livre-arbítrio começar a agir de modo correto."
[7] PINNOCK, Clark H., A Wideness in God's Mercy.
Sobre o autor: é ministro na Obra da Restauração de Tudo e pastoreia a Igreja em Engenheiro Pedreira, no Rio de Janeiro. É bacharel e licenciado em matemática, especialista em línguas originais da Bíblia (hebraico, aramaico e grego), doutor em divindade pela Faculdade de Ciências Filosóficas e Teológicas do Rio de Janeiro, bacharelando em Português-Hebraico pela UFRJ, tradutor de inglês, hebraico e espanhol e faz mestrado em Antigo Testamento no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, em São Paulo. Leciona Teologia Bíblica, Teologia Sistemática, Teologia Contemporânea, Hermenêutica, Exegese, Línguas Originais da Bíblia, Língua Portuguesa e Inglês no Colégio dos Pastores na Obra da Restauração de Tudo, no Rio de Janeiro. É 2o. vice-presidente da Academia Evangélica de Letras do Grande Rio.
Sobre o autor: é ministro na Obra da Restauração de Tudo e pastoreia a Igreja em Engenheiro Pedreira, no Rio de Janeiro. É bacharel e licenciado em matemática, especialista em línguas originais da Bíblia (hebraico, aramaico e grego), doutor em divindade pela Faculdade de Ciências Filosóficas e Teológicas do Rio de Janeiro, bacharelando em Português-Hebraico pela UFRJ, tradutor de inglês, hebraico e espanhol e faz mestrado em Antigo Testamento no Centro Presbiteriano de Pós-Graduação Andrew Jumper, em São Paulo. Leciona Teologia Bíblica, Teologia Sistemática, Teologia Contemporânea, Hermenêutica, Exegese, Línguas Originais da Bíblia, Língua Portuguesa e Inglês no Colégio dos Pastores na Obra da Restauração de Tudo, no Rio de Janeiro. É 2o. vice-presidente da Academia Evangélica de Letras do Grande Rio.
26/07/2014
Fonte: Monergismo
Via: Presbiterianos Calvinistas
Nenhum comentário:
Postar um comentário