É Deus quem disse: De trevas
resplandecerá luz (2Co 4.6)
Compreendo que é possível explicar esta passagem de quatro
formas distintas.
Primeiro, Deus ordenou à luz que brilhasse do meio da trevas, ou
seja, ele trouxe a luz do evangelho ao mundo através d ministério dos homens
que são, por sua própria natureza, filho das trevas.
Segundo, Deus produziu a luz do evangelho para substituir a lei
que estava oculta em sombras escuras, e daí trouxe luz das trevas. Os que são
amantes de sutilezas podem facilmente aceitar tais explicações, mas todo aquele
que penetre a questão de forma mais profunda prontamente reconhecerá que elas
não expressam o pensamento do apóstolo.
A terceira explicação é a de Ambrósio, e é como segue: Quando todos
se achavam envoltos em densas trevas, Deus acendeu a luz de seu evangelho. Os
homens se achavam submersos nas trevas da ignorância quando, repentinamente,
Deus brilhou sobre eles por intermédio de seu evangelho.
A quarta explicação é a de Crisóstomo, que acreditava existir aqui
uma alusão à criação do mundo. Deus, que através de sua Palavra criou a luz,
fazendo-a, por assim dizer, surgir das trevas, agora nos iluminou
espiritualmente, quando estávamos sepultados nas trevas. Esta analogia (anagoge)
entre a luz que é visível e física e a luz que é espiritual produz uma
interpretação mais agradável, e não há nela nada forçado, ainda que a tradução
de Ambrósio seja também plenamente adequada. Todos podem fazer uso de seu
próprio tirocínio.
Resplandeceu em nossos corações. Devemos observar cuidadosamente a
dupla iluminação a que ele faz aqui referência. Porque, em primeiro lugar, há a
iluminação do evangelho, e então vem a iluminação secreta, que toma assento em
nossos corações.
Porque, assim como em sua criação do mundo Deus derramou
sobre nós a resplandecência do sol e também nos muniu de olhos para que
pudéssemos contemplá-la, também, em nossa redenção, ele resplandeceu sobre nós
na pessoa de seu Filho, por intermédio de seu evangelho, mas que seria tudo em
vão, uma vez que somos cegos, a não ser que ele iluminasse também as nossas
mentes, por intermédio de seu Espírito. De forma que o seu pensamento é que
Deus abriu os olhos de nosso entendimento.
Na face de Jesus Cristo. Paulo já declarou que Cristo é a imagem do Pai; e
ao dizer aqui que em sua face a glória de Deus nos é revelada, o seu pensamento
é o mesmo. Esta passagem é muito importante, donde aprendemos que Deus não deve
ser visto por trás de sua inescrutável majestade (pois ele habita em luz
inacessível), mas deve ser conhecido na medida em que ele se nos revela em
Cristo. De modo que as tentativas humanas de conhecer Deus fora de Cristo são
efêmeras, porque tateiam no escuro. É verdade que à primeira vista Deus em
Cristo parece ser pobre e abjeto; porém sua glória desponta para aqueles que
têm a paciência de se transpor da cruz para a ressurreição. Vemos uma vez mais
que na palavra pessoa - aqui traduzida 'face' - há referência a nós, porque nos
é mais proveitoso contemplar Deus como ele aparece em seu Filho unigênito do
que investigar sua essência secreta.
Fonte – O
Calvinista. – 10/08/2014
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