Como vemos aqui em 1 Coríntios 15.10, aqueles que se põem deliberadamente em
oposição à graça de Deus, temendo que venhamos fazê-lo totalmente responsável
por tudo o que de bom fazemos, torcem estas palavras para que se ajustem ao seu
ponto de vista, como se Paulo estivesse vangloriando-se de que, por seus
próprios esforços, cuidasse de impedir a Deus de lhe conferir sua graça para
nenhum propósito. Conseqüentemente, chegaram à conclusão de que a graça é certamente
oferecida por Deus, mas o uso correto dela é algo que o homem tem em seu
próprio poder, e a responsabilidade de obtê-la, mantendo-a latente, é sua.
Nego, porém, que estas palavras de Paulo dêem qualquer apoio a esse ponto de
vista equivocado, porque neste versículo ele não está reivindicando nada para
si mesmo, como se tivesse feito, independente¬mente de Deus, algo louvável.
Então, o que ele quer dizer? A fim de não dar a impressão
de fazer fútil ostentação, com todo o vocabulário, porém carente de realidade,
ele declara que está afirmando aquilo que está à vista para quem quiser ver.
Finalmente, concedi¬do que estas palavras mostram que Paulo não fazia mau uso
da graça de Deus, e não a tornou inútil por sua própria negligência, todavia
sou de opinião que não temos qualquer justificativa, por essa conta, para
dividir entre ele e Deus o louvor que deve ser atribuído exclusivamente a Deus,
à vista do fato de que Deus nos outorga não só a capacidade de agir bem, mas
também a vontade de agir bem e o resultado de nossos esforços.
Trabalhei muito mais. Alguns acreditam que esta expressão
se direciona aos fanfarrões que, ao denegrirem a pessoa de Paulo, estavam
promovendo a si próprios e a seus futuros interesses pessoais; porque, segundo
este ponto de vista, não seria digno de Paulo querer entrar em competição com
os apóstolos. Mas quando ele se compara aos apóstolos, ele o faz motivado por
pessoas ímpias que tinham o hábito de confrontá-lo com eles a fim de rebaixarem
sua reputação, segundo vemos na epístola aos Gálatas (1.11). Assim, é bem
provável que ele esteja falando dos apóstolos, quando avalia seus próprios
esforços acima dos esforços deles. E certamente é verdade que ele se sobressaía
nas demais áreas, não só em suportar muitas dificuldades, em passar por muitas
provas e experiências, em abster-se de muitas coisas para cujo uso ele tinha
toda a liberdade, mas porque o Senhor estava coroando seus esforços com uma
maior medida de sucesso. Pois considero 'labor' como que significando os
resultados que deviam ser vistos em seu trabalho.
Não eu, mas a graça
de Deus que era comigo. Ao omitir o relativo [que], a Vulgata deu aos que não conhecem o
grego uma oportunidade de cometer equívoco. Porquanto ela traz: "Não eu,
mas a graça de Deus comigo", o que leva à conclusão que só a metade do
crédito é atribuída a Deus, enquanto que a outra metade é atribuída ao homem.
Portanto, o seu raciocínio é que Paulo não agia por conta própria, porquanto
nada poderia fazer sem a graça cooperante, enquanto que, ao mesmo tempo, seu
próprio livre-arbítrio e seus próprios esforços tinham sua própria participação
na ação. Porém, suas palavras vibram uma nota completamente diferente, pois,
havendo dito que algo lhe era aplicável, ele corrige isto e o transfere
inteiramente para Deus; inteiramente, insisto, e não apenas uma parte; pois
afirma que, seja o que for que pareça ter sido feito por ele, na verdade era
totalmente obra da graça. Este é deveras um versículo notável, não só em
reduzir a pó o orgulho humano, mas também em fazer evidente como a graça divina
age em nós. Porque, como se tivesse cometido um equívoco em fazer dele mesmo a
fonte de algo bom, Paulo corrige o que havia dito, e declara que a graça de
Deus é a causa eficiente de tudo. Não devemos imaginar que Paulo está meramente
simulando humildade, aqui.
Ele está falando de seu coração, como costuma fazer, e
porque sabe que esta é a plena verdade. Devemos, pois, aprender que o único bem
que temos é aquele que o Senhor nos concedeu graciosamente; que o único bem que
praticamos é aquele que ele produz em nós; que nada fazemos por nós mesmos,
senão que agimos somente quando somos influenciados; em outras palavras, quando
estamos sob a direção e influência do Espírito Santo.
Fonte – O Calvinista - 12/08/2014
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